segunda-feira, 17 de março de 2008

Nos Bares da Vida

Durante um carnaval – 1985 ou 1986 – aconteceu a inauguração do melhor boteco que já existiu em General Salgado: o Pereka’s.

Naquele tempo o movimento noturno estava centralizado na Lanchonete do Zé Frota, então sob a responsabilidade de Dona Maria Giamatei e filhos: Júnior, Cláudia e Roberval Cunha.

Para criar um ambiente alternativo, nosso amigo Eduardo “Pereca” Fernandes instalou um trailer no quintal de casa (na esquina das Ruas Diogo Garcia e Dr. Bruno Martins), fez uma cerca de madeira na esquina e passou a oferecer bebidas e quitutes até então nunca vistos na cidade.

Como a inauguração aconteceu durante um carnaval imediatamente o local se tornou o ponto principal da cidade. Pela primeira vez, inclusive, os foliões puderam tomar canja de galinha na madrugada, antes de refestelarem-se no necessário descanso preparatório para outra noite dos embalos do Rei Momo.

Na madrugada do primeiro dia, depois do último sopro do piston nos salões do Salgadense, juntamos a turma na calçada do Pereka’s. Uns aguardavam a canja, uns tomavam as penúltimas cervejas, outros esperavam carona e todos ainda animados.

Eu e o Vande Mendonça, para não perder o jeito, ainda tomávamos um dos últimos uísques da noitada. De repente alguém olhou para cima e conseguiu enxergar uma luzinha vermelha muito longe, para os lados da rodovia: “Puxa, mas aquela torre da Rede Globo é alta hein!”. Aí retrucou o nosso amigo Gappa (Willians Carlos de Castro), já em aparente estado letárgico depois de uma noite inteira de bebedeira:

- É alta, mas eu subo nela mesmo assim! Se vocês pagarem uma rodada de cerveja para todo mundo eu subo agora...

O pessoal ainda discutia se teria ele coragem e quem pagaria ou cobraria a aposta quando o Gappa já dobrava a esquina, seguido por um ou dois, no rumo do Jardim TV. Minutos depois, incrédulos, assistimos da esquina do Pereka’s a luz de sinalização da antena da TV Globo se apagar, desprendida pelas mãos do maluco do Gappa.

Na madrugada do dia seguinte, a mesma turma ocupando uma das mesas, todo mundo com o dinheiro meio curto, Vande se lembrou da aventura do dia anterior e da rodada de cerveja que correu patrocinada pelos curiosos e saiu pelas outras mesas:

- Se vocês pagarem uma caixa de cerveja o meu amigo Gappa vai apagar a lâmpada da torre da Globo!

Durante a Copa do Mundo de 1986 a turma se reunia no Pereka’s para assistir aos jogos do Brasil. Eu vinha de Araçatuba para não perder os festejos.

Muitas foram as vezes em que, altas horas da noite, bar fechado, a turma resistia bravamente no quintal atrás do trailer, churrasqueira acesa, freezer congelando a cerveja, violão e cantoria madrugada adentro.

Lá pelo final dos anos oitenta o dono não agüentou o rojão e vendeu o Bar para Leônidas dos Santos, o nosso amigo Boinha. Veterano freqüentador dos bares da vida, Boinha pela primeira vez na vida se meteu por detrás de um balcão.

Nos primeiros dias achou que sozinho dava conta do recado, não contratou ajudantes. Sábado à noite, movimento intenso nas ruas, todas as mesas tomadas, chega um grupo desconhecido, de alguma cidade vizinha, ocupa uma mesa e o Boinha corre para atendê-los. Vai anotando os pedidos: uma cerveja, um whisky, uma vodca, e o último soou estranho: um raifái.

Raifái? O botequeiro ficou matutando sobre o pedido, mas não deixou transparecer o desconhecimento: Trago tudo já. Levou a cerveja, o uísque e a vodca e avisou o quarto freguês: calma que o teu pedido já vem!.

Começou a procurar por detrás do balcão e pelas prateleiras: Meu Deus do céu, eu tenho mais de vinte anos de boteco e só agora me dei conta que nunca vi esse tal de raifái! Como será o rótulo desta porqueira?, vaticinava.

Vasculhou o depósito, procurou garrafa por garrafa e nada. A única saída foi voltar à mesa e improvisar uma desculpa:

- Meu amigo, me desculpe, mas a última garrafa acabou ontem, eu pedi e ainda não chegou. Escolhe outra coisa...

O rapaz olhou o copo do companheiro cheio de vodca e gelo e retrucou:

- Acabou a vodca?

- Não! Vodca tem bastante! – avisou o atendente.

- Então me traga uma vodca e uma Fanta. Misturou as bebidas na frente do Boinha e avisou: Moço, isso aqui é raifái!

Foi assim que o Velho Leônidas ficou sabendo da existência de um drinque de vodca com suco de laranja (ou refrigerante) chamado “Hi-Fi”, nome emprestado da abreviatura pela qual eram conhecidas as antigas vitrolas importadas dos EUA.

Meio desconcertado, ainda tentou se justificar:

- Não liga não, é que eu sou meio novo no negócio, tô aprendendo agora...

Nenhum comentário: