terça-feira, 21 de outubro de 2008

A História do Noroeste Paulista - 3

A região compreendida entre Fernandópolis e Santa Fé do Sul foi palco de grilagens de terras.
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No início do século XX o governo imperial passou a incentivar o desbravamento das terras interioranas em todo o país, especialmente no interior paulista. As chamadas terras do sertão de Rio Preto passaram a ser tomadas por expedições colonizadoras, que para apossar-se das terras, destruíam os aldeamentos caingangues.

Patrício Lopes de Souza, oriundo da vila de São Tiago, comarca de Bom Sucesso, na região de São João Del Rey (MG), era o chefe de uma destas expedições que entre 1830 e 1840 tomou para si a posse de quatro grandes áreas, três em Mato Grosso, às quais deu os nomes de Sobradinho, Sucuriu e Correntes, e outra no noroeste paulista, chamada São José da Ponte Pensa, com 208 mil alqueires, onde fez plantações de fumo e roça.

Anos depois, em 1860, Patrício de Souza retornou a São Tiago, deixando Francisco Ribeiro da Silva tomando conta das terras. Em 1864, Patrício firmou com Joaquim Anastácio de Souza um contrato de parceria para a exploração de suas quatro fazendas, e com ele e outros escravos retornou às terras que conquistara.

Em 1876 arrendou para os irmãos Francisco e João Ribeiro da Silva metade das terras da Ponte Pensa. Depois, já velho e alquebrado, Patrício Lopes de Souza regressou definitivamente à terra natal. Por testamento, deixou as terras da Fazenda São José da Ponte Pensa para os filhos de sua irmã Maria Tereza de Souza. Faleceu, em estado de solteiro, em 1885.

As terras ficaram praticamente abandonadas. Os meeiros criavam um pouco de gado e plantavam apenas o necessário à sobrevivência e à caracterização da posse. A imensidão da fazenda (208 mil alqueires) abrangia o território das atuais comarcas de Santa Fé do Sul e Jales, e parte das de Palmeira D´Oeste, Pereira Barreto e Estrela D´Oeste.

Preocupado com a situação fundiária, desde 1850 o governo procurava regularizar as posses das terras. Com a proclamação da República, as terras foram tidas como devolutas (desocupadas).

Em 1912 teve início um processo de grilagem.

Bernardino de Almeida, corretor de imóveis em Araraquara, dizendo-se sucessor de um tal de Fabrício Joaquim de Souza, através do advogado José Odorico da Cunha Glória, de Rio Preto, iniciou uma ação demarcatória de uma fazenda chamada “Palmital” ou “Ponte Pensa”, valendo-se de documentos posteriormente apurado serem falsos.

Concomitantemente, um cidadão chamado Mário Furquim, do Rio de Janeiro, ingressou com outro processo, também instruído com documentos falsos, segundo apurou-se posteriormente, dizendo ser ele o senhor e legítimo possuidor da Ponte Pensa.

O advogado Cunha Glória conseguiu afastar Bernardino da ação, passando ser ele o titular do direito possessório e, ato contínuo, no mesmo ano de 1912, fez um acordo com Furquim e ambos reconheceram-se mutuamente como legítimos proprietários das terras. Surgiu então a Sociedade Agrícola Glória & Furquim, reconhecida como verdadeira “fábrica” de títulos de terra falsos.

Em 1914 essa sociedade promoveu na Justiça Federal outra ação de demarcação da Fazenda Palmital, agora rebatizada com o nome Ponte Pensa. Os herdeiros de Patrício Lopes de Souza, citados pelo Diário Oficial, não contestaram a ação, mas o Governo do Estado o fez, argüindo a falsidade dos títulos, tantos dos de Bernardino, como os de Furquim, dizendo que as terras eram devolutas, portanto de propriedade do Estado de São Paulo.

Nessa ação, a firma Glória & Furquim contratou uma perícia técnica, que foi realizada pelo agrimensor Euphly Jalles. Com base no laudo de Euphly, o juiz considerou improcedentes as razões do Estado. Houve recurso para o Supremo Tribunal Federal, mas os advogados do Estado perderam o prazo para promover o preparo o recurso. Assim, o laudo de Euphy tornou-se definitivo. Por esse laudo, o agrimensor recebeu como honorário as terras do hoje município de Jales.

Concluído o engodo, a sociedade Glória & Furquim foi dissolvida e a área vendida em grandes lotes.

Em 1920, um major inglês, John Byng Paget, que se suspeita tenha sido mero testa de ferro de alguma companhia petrolífera, adquiriu 32 mil alqueires da antiga fazenda São José da Ponte Pensa, justamente na parte mais ao norte da área, nas divisas dos estados de Minas Gerais e Mato Grosso, onde se localizam as cidades de Rubinéia, Santa Clara D´Oeste, Santa Fé do Sul, Santa Rita D´Oeste, parte de Três Fronteiras, de Santana da Ponte Pensa e de Santa Salete.

A compra dessa extensa área por aquele major inglês, que nunca viera ao Brasil, segundo comentários, teria ocorrido porque a bacia hidrográfica do rio Paraná teria características de área propícia à formação de jazidas petrolíferas. Tanto que Byng Paget não se preocupou em explorar a área, em transformá-la em área de pastagens, como o fez, por exemplo, a Cia. The Lancashire General Investiment na fazenda dos Ingleses, em Santana da Ponte Pensa. Simplesmente limitou-se a tomar posse da área através de um procurador, Alfredo Norris, que, por sua vez, através de cartas de agregação, espécie de contrato de arrendamento rural, colocou na área 79 famílias, com o objetivo de garantir a posse ao senhor inglês.

A Constituição da República de 1946, porém, pôs por terra a pretensão de uma possível exploração petrolífera pelo major inglês ou pelos investidores que ele representasse. É que aquela Carta considerou como de propriedade da União o subsolo. Isso significa que o proprietário da terra só é dono de sua superfície e o que existir abaixo dele, como minas ou jazidas, pertence à União. Mal definido esse princípio pela Constituinte, Paget pôs a terra á venda.

Quem a comprou foi a Companhia Agrícola de Imigração e Colonização (CAIC), uma subsidiária da Cia. Paulista de Estradas de Ferro, que conhecia os planos de expansão da antiga Estrada de Ferro Araraquarense, que eram o de chegar até as barrancas do Rio Paraná e depois transpô-lo, rumo a Cuiabá.

A Companhia Paulista de Estrada de Ferro atravessava uma crise econômica do pós-guerra. Seus diretores procuravam uma solução. Tiveram a idéia de comprar os latifúndios existentes ao longo da rodovia, lotear e vender em pequenos lotes a lavradores sem terra. O pensamento era vender os lotes a prazo de quatro ou cinco anos, porque para pagar os lotes os lavradores teriam que trabalhar a terra e produzir, e a ferrovia teria o que transportar para gerar lucros.

Foi com essa filosofia que a Caic comprou as terras da então chamada Colônia Paget, que era administrada por Wenceslau Lopes e por seu filho Moacir de Oliveira Lopes que foi quem, em nome do inglês proprietário, transmitiu a posse aos representantes da Caic: Mário Camargo, que chegou à região em 15 de maio de 1946 e a Hélio de Oliveira, Humberto du Blois e Phebo de Oliveira Rogê Ferreira que aportaram às terras onze dias depois de Mário.

Na região conhecida como Córrego da Porteira, hoje Santa Salete, início das terras do inglês, a posse era garantida por João Teodoro Lopes; na região do Jacu Queimado viviam Antônio Lino e Messias Nogueira; noutro canto era Zerico que, de espingarda em punho, garantia a integridade da terra contra eventuais invasores. A fazenda Almeida Prado já estava sendo aberta por Rubens de Oliveira Camargo, desde 1940.

Feitos os levantamentos topográficos e demarcadas as terras, iniciou-se o seu parcelamento, dividida a gleba em sete sessões – a primeira era onde está Santa Fé e a sétima, perto de Urânia, em Santa Salete.

Antônio Carlos Salles Filho, presidente da Caic, determinou o início da construção da cidade que se tornou Santa Fé do Sul. O nome foi escolhido pelo fundador Hélio de Oliveira. A fundação oficial deu-se no dia 24 de junho de 1948, quando frei Canuto, um franciscano de Aparecida do Tabuado, celebrou a primeira missa, ao pé de um cruzeiro erguido na praça reservada à Igreja Matriz.

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