segunda-feira, 27 de outubro de 2008

A Fruta Preta

O Professor Paulo Ricoy de Camargo foi um dos primeiros professores de Nova Castilho e, anos depois, merecidamente conduzido à direção da escola. Sua esposa, dona Cida Toledo foi a primeira Escrivã do Cartório de Registro Civil do vilarejo.

Dono de físico avantajado, quando precisava se impor ou chamar a atenção de algum aluno usava de um vozeirão estridente. Os alunos mais bagunceiros tremiam ao receber suas broncas, pois ele exigia severa disciplina no interior da escola, cuja fiscalização competia ao Inspetor de alunos José Garcia Júnior, o Zé Martelo.

Naqueles tempos magros, a escola não dispunha de recursos, não havia cantina. Os alunos bebiam água em dois potes que existiam no pátio, sobre os quais havia um pedaço de tábua e uma caneca de alumínio. Os alunos faziam fila, enfiavam a caneca no pote, bebiam a água e passavam a caneca para o próximo.

O Professor Paulo era aficionado por caça e pescaria, dono de equipamentos, tralhas e uma coleção de armas. Aparentemente sisudo e severo, era na verdade um gozador, contador de piadas e apreciador de uma boa cachaça.

Tinha especial adoração pelos filhos Potó, Célia Marta e Zezé. Além disso, possuía um tesouro do qual pude usufruir: uma vasta biblioteca contendo os maiores clássicos da literatura mundial. Através deste acervo foi que descobri o maravilhoso mundo da leitura, viagem na qual ingressei sem nunca mais abandoná-la.

Certo dia, no quintal da casa do Professor Nardinho Toledo, seu cunhado, o professor observava algumas crianças em cima de um pé de jabuticabas. A árvore tinha os galhos enegrecidos pela carga de frutas. De cima da árvore, alguns alunos jogavam as jabuticabas para os demais que, no chão, enchiam embornais.

No meio das crianças estava o Zé Paçoca, um garoto muito engraçado e dono de uma dicção extremamente difícil. Por ter a língua presa, trocava as letras, engolia esses e erres.

As jabuticabas atiradas do alto rolavam por uma pequena ladeira, próxima da qual o Professor Paulo se achava a observar a garotada.

De repente o Zé Paçoca saiu a perseguir as frutas que se desgarraram ladeira abaixo e procurando com os olhos no chão, deu de cara com o professor:

- Teu Paulo, o toi não viu ua puta peta que patou ati?

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