segunda-feira, 7 de janeiro de 2008

A Folia do Divino

Folia de Reis - Chegada da folia no Sítio São Domingos (G. Salgado)
(foto: Álbum do blogueiro)

A região de General Salgado tem uma grande tradição em Folias de Reis. Nova Castilho, Gastão Vidigal, Nova Luzitânia, Santo Antonio do Aracanguá, são algumas das cidades que sempre promoveram festejos, saídas e chegadas de foliões em louvor ao Divino Espírito Santo.

A Folia de Reis chegou ao Brasil vinda de Portugal onde tinha como finalidade apenas o divertimento do povo. Entre nós adquiriu um sentido mais religioso. Reproduz a viagem dos Reis Magos (Gaspar, Balthazar e Melchior) a Belém para adorar ao Deus-Menino (Jesus Cristo) e comumente é organizada por devoção ou pagamento de promessas.

Em suas jornadas as folias percorrem ruas, estradas, vilas e povoados cantando as profecias e pedindo oferendas para a festa de encerramento da jornada. Cantam defronte das casas pedindo a abertura de portas, saúdam e pedem benção para moradores e familiares, contam as façanhas dos Reis Magos, passagens da vida do Cristo e finalizam agradecendo a acolhida e as ofertas. Seu ciclo de apresentação costuma ser de 24 de dezembro a 6 de janeiro.

A exemplo de outras famílias salgadenses, a minha também tem alguma tradição em tais festejos. Foi durante uma Festa de Reis no Córrego do Lajeado, patrocinada por vovô Álvaro de Almeida que meus pais começaram a namorar. Parece que enquanto os foliões cantavam, os palhaços saracoteavam e os instrumentos tiniam, dona Cida não tirava os olhos do escrivão da folia, que não sabia se olhava o caderno com as anotações das prendas ou se correspondia ao flerte.

Desde o nascimento também estou intimamente ligado aos Reis Magos. Por conta da noite muito mal dormida que tive no dia em que nasci, vovó Arandira Marques fez uma intenção religiosa aos Santos Reis, que no dia seguinte – depois de passado o susto - foram agraciados com o acréscimo do sobrenome “Reis” ao meu nome de batismo.

Há muitos anos, no mês de janeiro, promovemos lá na beira do Lajeado um pequeno festejo em louvor aos Santos. Nos primeiros sete anos a festa foi de vulto, com muitos convidados e a chegada da folia em grande estilo, combate de palhaços, passagem pelos arcos enfeitados, terço, loas e ladainhas. Depois de cumpridos os sete anos do compromisso assumido, continuamos com o evento em menor escala, apenas com o terço e pequeno grupo de amigos, mas com a mesma devoção e agradecimento pelas bênçãos recebidas.

De certa feita, quando ainda morávamos em Salgado, acompanhei por vários dias uma Folia, como parte do grupo de músicos. Foi para mim imensa satisfação principalmente por perceber como os foliões são pessoas simples, porém dedicadas e capacitadas.

Toda folia tem uma bandeira que a identifica e que simboliza, ao mesmo tempo, a jornada dos Reis Magos a Belém e a intenção com que os foliões se dispõem à peregrinação. A bandeira segue sempre à frente do grupo, ladeada pelo mestre e pelo contramestre, carregada por um folião a quem se chama de bandeireiro ou alferes. O estandarte geralmente se compõe de um pedaço de pano atado a um pequeno mastro, enfeitado de fitas, papel de seda, espelhos, rosas artificiais, emoldurando um motivo religioso, como a cena dos Magos sob a Estrela do Oriente a caminho de Belém. Algumas bandeiras estampam ainda os santos de predileção dos festeiros.

Os figurantes da folia dividem-se em foliões e palhaços. No primeiro grupo estão os músicos, o bandeireiro e o escrivão. O chefe da folia é o mestre, autoridade suprema a quem todos devem obediência. Recai sobre seus ombros toda a responsabilidade do grupo que comanda. A ele compete ainda dirigir a orquestra, manter a disciplina, iniciar e encerrar os cânticos. O contramestre é o substituto eventual do mestre, é o encarregado de complementar a cantoria. Os demais formam o coro de repetição. Ao escrivão compete registrar as doações e oferendas.

Os palhaços são divertidos e irreverentes, no desenvolvimento do Auto constituem-se na grande atração popular da folia. Vestem-se com uma espécie de pijama de pano colorido, carregam um pequeno embornal, usam máscaras de estranha figura e empunham uma longa espada de madeira, com a qual se exercitam durante as exibições. Promovem troças, zombarias, fazem gracejos para com os foliões e os demais presentes, recitam versos religiosos e fazem a comunicação entre o mestre e o dono da casa, comumente chamado de “patrão”.

Para chegar à porta de uma casa a folia deve obter permissão do dono. Em seguida deve postar-se à entrada e entoar cânticos contando a missão empenhada, louvando a bandeira, saudando o dono da casa e pedindo permissão para adentrar. O dono da casa deve segurar a bandeira e depois adentrar a casa à frente da folia. No interior da residência a folia entoa novos cânticos, desta vez pedindo oferendas, encomendando bênçãos e convidando para a festa de encerramento da caminhada.

Assim como os palhaços adoram saracotear, dançar com saltos e meneios, mexer com os circunstantes e arreliar as crianças, os donos da casa também podem preparar-lhes algumas brincadeiras, como esconder moedas ou notas dobradas em lugares próximos à entrada da casa, condicionando a entrada da folia à localização destes mimos. Durante as cantorias também podem aprisionar os palhaços, arrastando-os para outros cômodos, ainda que à força. Quando isto acontece o mestre fica obrigado a entoar cânticos pedindo liberdade para seus “soldados”, para que a folia possa seguir adiante.

Mas a participação dos palhaços também tem um lado bastante sério, pois estão vinculados a severa disciplina. Devem obediência ao mestre, não podem passar adiante da bandeira, devem ficar ao lado ou atrás dela. Nos intervalos das cantorias costumam fazer saudações religiosas, dando vivas aos Reis Magos, a Nosso Senhor, à Virgem Maria, aos foliões e aos donos da casa, tudo isso em desabalada carreira, a voz aos ofegos, característica da ginástica e da gritaria que fazem parte de seu ofício. Quando alguma prenda é ofertada em nome de algum ente familiar já falecido, os palhaços se ajoelham, cruzam as espadas e nesta posição devem aguardar que o mestre, cantando, encomende bênçãos à alma do finado.

São rituais e costumes arraigados à alma do nosso povo, tradições que acabam passando de pai para filho e que não podem, a meu ver, deixar de ser cultivadas com zelo, dedicação e respeito.

Para finalizar uma historinha de foliões, que me foi contada pelo amigo Waldomirinho. Em Magda (SP) havia um cidadão que todo ano cumpria promessa de atuar como palhaço de Folia de Reis. Era um sujeito forte, obeso e que, por mal dos pecados, costumava exagerar na cachaça. Bastava o mestre baixar a vigilância e ele ia bebericando aos poucos, até que no final do dia quase não se agüentava de pé.

Certo dia, valendo-se da frouxa vigilância bebeu mais do que de costume e, antes do término das funções do dia, durante uns passos de dança mais ousados, estatelou-se no chão, ficando ali estirado, obrigando o mestre a encerrar abruptamente a cantoria. Os companheiros foram até ele e começaram a cutucá-lo, pedindo para que se levantasse, pois a função tinha que continuar.

A cada tentativa de levantá-lo do chão os amigos ficavam com pedaços de sua roupa na mão. O mestre, já se mostrando nervoso e contrariado com aquela atitude, chamou-lhe a atenção de forma ríspida:

- Rapaz, você tá pensando que isso aqui é brincadeira? Levante daí, onde se viu um palhaço de folia esparramado no chão!

O rapaz abriu um olho, deu uma espiada na braveza do mestre e justificou-se, com a voz pastosa:

- Calma seu mestre, se o senhor não sabe, tem uma parte do ofício que é deitado!

Um comentário:

Anônimo disse...

parabens pelo blog...
Na musica country VIRGINIA DE MAURO a LULLY de BETO CARRERO vem fazendo o maior sucesso com seu CD MUNDO ENCANTADO em homenagem ao Parque Temático em PENHA/SC. Asssistam no YOUTUBE sessão TRAPINHASTUBE, musicas como: CAVALEIRO DA VITÓRIA, MEU PADRINHO BETO CARRERO, ENTRE OUTRAS...
VIRGINIA DE MAURO a LULLY é o sonho eterno de BETO CARRERO e a mão de DEUS.