segunda-feira, 14 de abril de 2008

Na Beira do Rio

Os salgadenses adeptos da pescaria sempre tiveram várias opções para molhar a minhoca: o Córrego do Talhado, próximo a São João do Iracema, a Lagoa do Bicho, em Nova Castilho, o Ribeirão Açoita Cavalos, a Represa Municipal, os ranchos de Auriflama e Santo Antonio do Aracanguá que proliferaram depois do alagamento do Rio Tietê.

Nossa turma gostava de freqüentar algumas cachoeiras que ficaram famosas. Uma nos fundos do sítio do Sr. Anésio Arruda, outra na fazenda do Bob Pompílio, eram as preferidas. A gente chegava bem cedinho, quase madrugada, e só retornava quando o sol baixava no horizonte.

Num dos embalos no sítio do Pedrinho Arruda, no meio da festa o amigo Gustão Cervantes contou aos demais que recentemente havia prestado vestibular e aguardava o resultado com ansiedade. O estado etílico estava tão elevado que todo mundo entendeu ter ele sido aprovado no concurso e, na mesma hora, promoveram um trote no calouro. Quase lhe tiraram o escalpo.

Os irmãos Vande e Mick Mendonça sempre foram fanáticos por pescaria. Professor na grande São Paulo, Mick aparecia de vez em quando na cidade e nestas oportunidades fazia de tudo para levar sua turma à beira do rio. O porta-malas do seu Passat branco era o que se podia chamar de armário ambulante.

Tinha tralha de pesca completa, material de futebol (incluindo bola, chuteira, tênis, meias, caneleiras, faixas, calção...) até ferramentas para a roda-de-samba: surdo, pandeiro, tamborim, timba.

Numa manhã que sucedeu a um dia bastante chuvoso - as poças d’água ainda resistiam sob os raios da aurora radiosa - Mick reuniu outros pescadores para irem até o Barreiro, próximo a Auriflama. Dentre eles: Vande, Gilmar Prado, Valdir Cardoso, Marquinhos Secches e Acir Vieira. Levaram a tralha de pesca, alguns apetrechos de cozinha, muita cachaça, e adivinhando a fartura de peixe, sal e arroz.

Arrumaram o acampamento e partiram para a pesca. Vinha peixe de todo lado e a turma foi enchendo o embornal ao mesmo tempo em que enchia a cara, emborcando a cervejinha gelada. De tão animados se esqueceram da fome e ninguém se animava em preparar o almoço. Depois de muita discussão Vande se alistou como cozinheiro e partiu para o acampamento.

O resto da turma ficou bebericando e molhando a minhoca. De longe viam a movimentação do cozinheiro limpando os peixes, arrumando as panelas, atiçando o fogo. Depois de algum tempo um grito avisou:

- A bóia tá pronta!

Ao botarem os olhos no vistoso rango, quase não acreditaram, pois a fome cutucava forte e o aroma do peixe frito se harmonizava com o visual do arroz, temperado com massa de tomate. Em minutos todos degustavam a iguaria com avidez.

De repente alguém estrilou: a comida tinha um gosto estranho. Outro concordou: parece que tem areia!. Surgiram alguns palpites diferentes, mas a conclusão era só uma, havia algo muito estranho, o sabor não combinava com o visual da gororoba. O arroz foi praticamente deixado de lado enquanto o peixe foi todo consumido.

Então alguém se lembrou de um pequeno detalhe e inquiriu o cozinheiro:

- Vande, como é que esse arroz tá assim temperado, vermelhinho, se ninguém trouxe massa de tomate?

- Ué! É que pra cozinhar o arroz eu usei água da enxurrada!

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