segunda-feira, 3 de dezembro de 2007

Respeitável Público!

Largo da Praça de Nova Castilho nos anos 70 - Igreja de São José

Criança pequena lá em Nova Castilho tinha poucas opções de diversão: quermesse, festa junina e circo. Nem Parque de Diversões existia. De vez em quando surgia um Circo de Touradas ao qual a gente tinha acesso franqueado porque vovô Braz Firmino emprestava o gado para os toureiros fazerem suas peripécias. Eu gostava do show e também dos nomes dos toureiros: Capa Preta, Parafuso, Terra Roxa...

Na Praça havia um amplo e deserto Largo e ao lado da Igreja a Barraca-Bar, onde eram realizadas as quermesses. Não existia tômbola, bingo, estes jogos de azar pelos quais os participantes teimam a noite toda para ganhar um franguinho assado. Muito menos aquele sujeito gritando no ouvido da gente os números sorteados: "dois machados num pau só: setenta e sete"; "dois patinhos na lagoa: vinte e dois"; "olha o cheiroso: vinte e quatro".

Naquele tempo só havia o leilão e uma disputa entre amigos onde um arrematava a prenda e oferecia ao outro de presente. Logo depois o amigo retribuía o mimo. Em Castilho o locutor da quermesse era Armindo Thomaz, o Doca da Farmácia.

Como não existia Festa do Peão com show musical, a única oportunidade de assistir apresentações de artistas (do disco, do rádio e da televisão, como anunciavam os potentes alto-falantes) era nos circos, e todos, invariavelmente, duplas sertanejas.

Em Nova Castilho assisti pela primeira vez e maravilhado, a minha dupla caipira preferida: Tião Carreiro e Pardinho. Antes do show havia o drama, como eram chamadas as encenações teatrais nas quais os músicos se misturavam aos circenses. A molecada ficava tentando adivinhar qual dos personagens era o cantor.

Mesmo quando me mudei para a cidade os circos ainda eram as grandes atrações para a garotada. Eram montados no Campo de Futebol da Creche ou em frente à Delegacia de Polícia. Neles assisti, pela primeira vez, uma dupla que era a sensação do momento: Milionário e José Rico. No circo lotado parecia que não caberia mais uma única pessoa. Onde um tirava o pé o outro punha.

Havia também o circo do Tony e do Paçoca, o Gran Circo Argentino. A princípio eu não entendia bem por que é que a garotada lotava as matinês e queria voltar à noite com os pais. Depois fiquei sabendo que a maior atração do circo era a bailarina. A garotada babava ao vê-la dançando porque ela era salgadense e casada com o dono do circo.

Contam que Rita Veschi foi - a seu tempo - a moça mais bonita de General Salgado e que o seu casamento com o Tony, dono do Circo Argentino, causou um alvoroço na cidade, dado o desespero dos adolescentes apaixonados por ela que não se conformaram com a perda. A consolação dos chorões era vê-la dançando no circo.

No Circo Argentino certa vez assisti Chitãozinho e Xororó como atores num dramalhão daqueles bem sentimentais e trágicos, tipo novela mexicana. Naquela época ninguém diria que eles chegariam tão longe.

As lutas livres também faziam sucesso e delas participavam mulheres boas de briga. Anunciavam a "Mulher Montanha, a lutadora mais forte da face da terra", e outras gladiadoras com nomes sugestivos e a equipe circense saia pelas ruas convocando os citadinos de coragem a enfrentarem as feras.

Existia um salgadense que encarava tais lutas, o João Gato (João Domingos Ferraz Liebana). Desde moleque era metido a briguento, queria bater em todo mundo, e quando o circo oferecia a chance lá ia ele enfrentar as lutadoras.

Era um grande espetáculo, com parte do público torcendo pelo salgadense e a maioria gritando para que aquele mulherão (literalmente falando) lhe acertasse uns sopapos. No dia seguinte ele adorava sair às ruas para ouvir os comentários sobre a contenda, e quando exibia um olho roxo ou um arranhão no rosto se apressava em justificar:

- Vocês não viram o estrago que eu fiz naquele brutamonte!

A molecada gostava tanto de circo que, encerrada a semana de espetáculos, todos corriam a montar cirquinhos nos quintais, cercados por lençóis e cobertores sorrateiramente emprestados das mães. Meus vizinhos Renato Fantini, Cássio de Vergílio, Celso Cardoso, Élio de Freitas e Serginho Guimarães, eram os mais animados. O ingresso era um determinado número de palitos de fósforo. Na casa do Renato Fantini o circo era mais requintado, com tabuleiros, jogos de argolas e prêmios com balas e chicletes.

De certa feita resolvi eu montar um circo no fundo do quintal de casa. Meu amigo Ivan de Morais era o aluno mais engraçado da minha sala na Escola Ângelo Scarin, contava piadas, fazia imitações, era talentoso.

Convidei-o para fazer um show no meu circo e ele topou. A vizinhança lotou a garagem e, depois das apresentações iniciais colocamos o artista no palco. Ele disparou a contar piadas cabeludas (a assistência era toda menor de doze anos) e minha irmãzinha Cleire (que devia ter uns seis, sete anos) levantou-se de seu lugar com ares de inconformada, subiu no improvisado palco e sapecou de tapas o espevitado Ivan.

Foi um sucesso. A platéia riu muito, soaram palmas e apupos, todos adoraram a cena. No dia seguinte tentamos um repeteco sem êxito, ninguém riu como no dia anterior. Encerrei aí a minha carreira de dono de circo e acredito que o Ivan também abandonou os picadeiros depois daquele dia.

Mas o fato mais engraçado acontecido nos circos salgadenses foi com outro personagem que aprontava muito: Mauro Sérgio Castilho, filho do Vando Castilho.

Existia uma cantora que sempre repetia a mesma música. Era uma música horrível, com um refrão sofrível, que repetia o tempo todo: “Ai que vontade de comer goiaba, ai que vontade de comer goiaba”.

Não mais suportando a renitente melodia, Mauro Sérgio entrou no circo com um embornal a tiracolo e ninguém entendeu o motivo. Quando a cantora chegou ao refrão ele abriu o embornal:

- É goiaba que você quer? Então, toma! - e despejou um saco de goiabas nos pés da moça.

No show do dia seguinte ela mudou o repertório.

4 comentários:

Breno disse...

Cal - seu conto me fez lembrar de uma história que tenho certeza que todos que presenciaram se lembram com detalhes. Circo na casa do Fabinho e Mateus. Coisa de profissional-mirim. Um dia inteiro armando os preparativos, equipe de divulgação, atrações sensacionais, e como não poderia deixar de ser um ótimo jogo de luz. Noitinha e a plateia estava lotando o recinto, eis que o responsável pelo jogo de luz (entende-se lanterna) sobe na goiabeira e se prepara para o início do espetáculo. Não deu nem dois segundos e a iluminação começou a rodar, galhadas iam se quebrando e lá estava o Boca estendido no meio do picadeiro todo estrupiado. Sucesso total. Infelizmente não conseguimos convencer o Boca a repetir o ato no dia seguinte.

Anônimo disse...

parabens pelo respeitavel publico, pois lendo esta história me lembro bem de minha infancia, onde no fundo da serralheria (ou serraria)do seu pedro veschi, tambem montavamos o nosso cirquinho, que por coincidencia o ingresso era palitos de fosforos............valeu por me fazer lembrar um pouquinho de minha infancia, que graças a DEUS podemos dizer tivemos infancia........abraços...........

Unknown disse...

Oi Carlos me lembrei!! logo que nos
mudamos pra Salgado, fui ao Circo, cujo o nome nao me lembro. E la vi
Chitãozinho e Xororó no começo da
carreira, ai que saudades!! e como era bom aquele tempo, aquela cidade.
abraçao e parabens mais uma vez.

Carlos José Reis de Almeida (Cal) disse...

Breno, Marcos e Sandra. Obrigado pelos comentários e pelas histórias. Voltem sempre. Abraços. CAL