terça-feira, 2 de junho de 2009

Tombos e Mancadas

O público se acotovelava pelas arquibancadas literalmente tomadas. Pelas vielas do recinto outro tanto de gente se movimentava diante de um espremido comércio: barraquinhas de bugigangas de todo tipo, bebidas, acessórios, vestuário, calçados, um pouco de tudo.

O tradicional sanduíche de pernil com calabresa afrontava o olfato dos circundantes que trocavam pernas pelos corredores do "Vietnã", uma infinidade de barraquinhas cobertas de lona plástica colorida, repletas de badulaques.

Um intrépido locutor anunciava para dentro de instantes o início do grande espetáculo. Após longa espera de quase doze meses, o povo daquela próspera e pacata cidadezinha interiorana assistiria novamente a Festa do Peão de Boiadeiro.

- Senhoras e Senhores, boa noite, boa noite, boa noite... Vai começar a festa da moçada do chapéu grande, da bota do cano compriiiiido...

Enquanto isso o Luiz Quilovate, instalado no interior do estúdio de som, improvisado na carroceria de um caminhão, se entretinha em seu inarredável vício: histórias em quadrinhos e congêneres.

Todos os que acompanhavam o rodeio, peões, barraqueiros, tropeiros, já sabiam que o Quilovate não trocava sua leitura dinâmica, nem mesmo por uma dúzia de cervejas geladas na Barraca da Comissão, ou por um ingresso do Baile do Cowboy.

O pior era que durante o espetáculo, por vezes se esquecia de que era o sonoplasta, responsável pelas músicas, pelas brincadeiras e efeitos sonoros, enfim, pela sobrevivência do locutor. E as gafes se sucediam.

Desta vez, o locutor havia convidado as autoridades presentes, o presidente da comissão organizadora, o Prefeito, os profissionais do rodeio adentraram a arena aguardando a abertura da noitada.

- Senhores e Senhores; peço que fiquem de pé, para ouvirmos o hino mais bonito do mundo: o Hino Nacional Brasileiro!

Seguiu-se um profundo silêncio, após o povo haver se postado civicamente. Um pouco assustado, tentou o locutor chamar a atenção do assistente, que certamente não havia deixado a leitura da Playboy:

- O hino nacional brasileiro...LUIZ!

Novo silêncio. Ansioso e preocupado pela lamentável ocorrência, o narrador repetiu o aviso quase gritando:

- LUIZ! O hino nacional!!!

Despertado pelo susto, num sobressalto o Luizinho apanhou rapidamente a primeira fita-cassete que encontrou e levantou o polegar para o locutor como que dizendo: "Agora vai". O mestre da cerimônia ainda tentou disfarçar:

- Desculpem-nos senhoras e senhores, pela pequena falha técnica, já solucionada, e prosseguindo ouviremos agora com o respeito de todos, a melodia que enaltece o povo brasileiro!

E o povão quase não acreditou quando o "play" do Quilovate disparou as conhecidas vozes de Tião Carreiro e Pardinho:

- A coisa tá feia, a coisa tá preta....

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